MONOGRAFIA 3° LUGAR

CONCURSO DE MONOGRAFIAS SOBRE A VIDA E A OBRA DE FELIPE TIAGO GOMES



UMA MISSÃO DE CIDADANIA

Izabel da Silva Rodrigues (Discípula do Apóstolo Cidadão)




Picuí - PB
2011
IZABEL DA SILVA RODRUGUES (DISCÍPULA DO APÓSTOLO CIDADÃO)



UMA MISSÃO DE CIDADANIA



Monografia apresentada à Banca Examinadora do Concurso de Monografias sobre a vida e a obra de Felipe Tiago Gomes.

Picuí – PB
2011
SUMÁRIO

RESUMO........................................................................................................................04
1. INTRODUÇÃO.........................................................................................................05
2. O REBENTO E A MISSÃO DE CIDADANIA......................................................06
3. A INFÂNCIA HUMILDE.........................................................................................06
4. O JOVEM LIDADOR...............................................................................................07
5. RECIFE E O APARECIMENTO DA MISSÃO....................................................08
6. CONCRETIZANDO UM SONHO HUMANITÁRIO...........................................10
7. BATALHA COM A BUROCRACIA E A ODISSEIA NO RIO DE JANEIRO.11
8. “CNEC A OBRA QUE ASSUSTA OS QUE NÃO A CONHECEM”..................12
9. A CNEC EM PICUÍ..................................................................................................14
10. O BEM QUE SE PERPETUA................................................................................15
11. A CNEC NO CONTEXTO ATUAL......................................................................15
12. O APÓSTOLO E SEU LEGADO..........................................................................16
13. CONCLUSÃO..........................................................................................................17
   REFERÊNCIAS..........................................................................................................18
  


RESUMO


Este trabalho esboça os aspectos da vida e enfatiza a grandiosidade da ação de Felipe Tiago Gomes. O apóstolo da educação comunitária como assim está sendo chamado viveu inteiramente para sua obra      de exaltação a cidadania e construção do bem comum. É relevante abordarmos a história de um homem que mesmo diante de grandes dificuldades não abandonava seus ideais sempre voltados para o bem do próximo, algo próprio dos grandes homens. Sua memorável ação, a CNEC (Campanha Nacional das Escolas da Comunidade), foi uma “luz nas trevas” para milhares de pessoas humildes que não vislumbravam maiores perspectivas dentro de um universo de submissão e ignorância.  A CNEC formou inúmeros cidadãos que ainda compartilham valores como a solidariedade e dedicação à causa do bem social. Este trabalho foi baseado em livros que se referem à vida e obra de Felipe Tiago Gomes, a exemplo das publicações HISTÓRIA DA CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE de Felipe Tiago Gomes; CNEC 25 anos documentário de 1986; História de vida 45 anos educando ambos de Maria de Lourdes Henriques, além do livro CNEC um estudo histórico de Ivanildo Coelho de Holanda. No que concerne a metodologia, este trabalho refere-se à uma pesquisa bibliográfica, tendo como objetivo abordar a história e ação de um homem cuja vida foi baseada no exercício pleno da cidadania.  A célebre iniciativa do professor Felipe em criar uma entidade que oferecia o ensino ginasial gratuito tornou-se maior do que se esperava e se concretizou em uma ação transcendental que mesmo no contexto contemporâneo é tomada como exemplo por aqueles que pretendem transformar a educação. A CNEC continua transmitindo idealismo e fazendo da educação um mecanismo transformador.


PALAVRAS CHAVES: Cidadania. Missão. Bem-comum. Transcendental.


1.    INTRODUÇÃO


    O presente trabalho tem por objetivo traçar os principais momentos da vida de Felipe Tiago Gomes, trajetória essa que chega a se confundir em alguns momentos com a sua própria obra. Uma vez que, sua existência foi resumida a executar uma nobre missão de cidadania, pautada sobre a disseminação da semente transformadora da educação comunitária, cujo ideal era revolucionário para uma época na qual a educação pertencia à elite. Às pessoas humildes restava conviver com as incertezas de uma vida imóvel sem esperança de um amanhã melhor.
    Entretanto, essa realidade começou a sofrer significativas modificações a partir do momento em que um simples e carente estudante passa a questionar tamanha injustiça.  Porém não se indigna em silêncio, vai à luta, protagoniza e transforma os fatos levando a uma verdadeira revolução dentro do incipiente sistema educacional brasileiro. A grande arma para a essa memorável batalha foi a criação da CNEC, uma entidade humanitária sem fins lucrativos ou partidários, mas essencialmente cidadã que se apoiava na comunidade, numa magnífica exaltação à democracia. Essa realização foi responsável por levar esperança a inúmeros brasileiros que talvez nunca tivessem recebido uma única oportunidade para que pudessem sonhar com dias melhores.
    Mas, a CNEC os levou a sonhar, a se realizar e verem outros se realizando. Essa ação é grandiosa porque realiza o bem. Não surgiu da vaidade nem da ambição, mas de um verdadeiro desejo de ajudar aqueles que eram impedidos de crescer, de viver melhor, simplesmente porque não possuíam recursos para estudar. Essas pessoas humildes não usufruíam o direito à liberdade plena de pensar por se mesmas, pois eram alienadas pelos enlaços da ignorância, que Felipe Tiago Gomes veio a cortar anunciando um tempo novo de esperança e luz, a luz do saber que liberta. Essa foi a essência da ação do apóstolo da educação comunitária.


2.    O REBENTO E A MISSÃO DE CIDADANIA


    Década de 1920. O Brasil era uma jovem nação republicana subjugada aos mandos dos coronéis, lugar com poucas oportunidades para aqueles distantes da elite agrária. No nordeste brasileiro, região pobre e castigada pelas constantes secas o abandono do estado e as arbitrariedades dos grandes senhores de terra não davam margem para melhorias, apenas propiciava um continuísmo de submissão pobreza e ignorância. Esta era a realidade do interior paraibano, quando no dia 1° de maio de 1921 nasce,em um lar pobre e simplório no sítio Barra do Pedro do município de Picuí, um menino chamado de Felipe Tiago, nome forte que invocava dois apóstolos de Cristo. Seus modestos genitores não conseguiriam imaginar que acalentavam e formariam um dos grandes cidadãos deste país, cujo ideal era dar oportunidades iguais aos menos favorecidos por meio da educação que viria trazer a esperança e a luz da sabedoria para aqueles que assim como ele desejava compartilhar o cálice do saber.

3.    A INFÂNCIA HUMILDE


     Na vida simples da zona rural do sertão paraibano, Felipe convivia em meio às dificuldades da época, pois seus pais (Ana Maria Gomes e Elias Gomes Correia) humildes agricultores, criaram seus filhos vencendo o drama das secas e da ausência de recursos. Entretanto, não deixava de lhes abastecer com os mais admiráveis ensinamentos morais, baseados na ética e no amor ao próximo. Aos filhos ensinavam o valor do trabalho, assim relatam senis picuienses que conheceram a infância de Felipe. Dizem que não raramente o viam buscando água nos rudimentares reservatórios da região, supostamente ajudava a sua mãe.
Apesar dos problemas típicos daquela época difícil, havia os momentos para as distrações em que incluía a transmissão oral de fatos, uma vez que naquele período ainda não havia os meio de comunicação de massa. Dessa maneira as pessoas se entretinham com os causos das histórias de Trancoso, das lendas regionais como as de “Cumade Fulozinha”, entre outras histórias de assombração e fantasmas que colocava medo no pequeno Felipe Tiago. Havia também eventos religiosos, como as missões peculiares daquele momento da nascente república que diante da realidade do meio rural e carente de divertimento acabava sendo também uma forma de distração. Assim transcursava a infância de Felipe Tiago Gomes com os desconfortos da vida pobre, mas repleta de esperança como todo coração humilde.
No seio singelo de sua família, o menino crescia e dava sinais de sua grande missão matriculado para o curso primário vencia a longa distância da escola movido pelo prodigioso desejo de aprender. É inequívoco que as dificuldades eram imensas, contudo o ideal dos grandes homens permanecia naquele coração pueril e o desânimo ali não encontrava moradia. Como pode ser lido no seguinte fragmento:

O menino pobre, sobraçando um livro velho, envergando uma roupinha de brim barato, pisa a poeira quente da estrada, rumo à escolinha distante (...) mas, o sacrifício da longa caminhada de ida e volta não desanima o rapazinho. Ao regressar, vem sempre satisfeito com os novos ensinamentos recebidos” (HENRIQUES, 1986, p.43)

O citado relato é precioso para que seja entendida a grandiosidade da obra, que bem traduz o espírito de seu criador. Por isso merece a honra de ser lembrado e admirado, pois se constitui como um exemplo de superação incomum em uma época sem mobilidade para as pessoas humildes. Ilustre é sua vida e obra não apenas pelos feitos que promoveu, mas devido ao bem que gerou na vida de inúmeros brasileiros que talvez nunca fossem vislumbrar maiores oportunidades em um ambiente de poucos recursos. Felipe também não enxergava maiores perspectivas no meio onde vivia, porém na educação enxergava um caminho de ascensão, por isso se esmerava naquilo que resumia sua vivência: o aprendizado. Esse zelo lhe renderia força e apoio perante os empecilhos que enfrentaria.
Ninguém imaginaria que daquele seio familiar humilde, daquela terra naturalmente sofrida, ascenderia uma grande promessa, um homem que transformaria a realidade e a mentalidade de uma nação desigual que relegava aos desprovidos de riquezas os infortúnios das mais pesadas tarefas. Enquanto que os mais abastados desfrutavam de leves afazeres, haja vista que possuíam e dominavam a instrução.    

4.    O JOVEM LIDADOR


    Diante do cotidiano de estudante pobre, baseado na luta contínua e nas privações, Felipe Tiago se mostrava como raro exemplo que mesmo diante das insalubridades se fazia convencido do espírito transformador da educação, esta concepção seria o cerne da sua luta. Assim, comovido com o forte desejo de aprender de seu jovem educando, um de seus professores aconselha o pai de Felipe a colocá-lo no colégio Pio XI, em Campina grande para dar continuidade aos seus estudos. Lá estando, o carente estudante se depara com um universo novo de conhecimentos ao mesmo tempo em que passa a conviver com os desafios do estudante pobre. Entretanto, o choque socioeconômico, vivido pelo jovem idealista, foi amenizado pela ajuda de pessoas comprometidas com o bem do próximo, algo que Felipe Tiago Gomes gozaria e disseminaria em toda sua ação em prol da educação comunitária. Dessa forma, conhecendo as dificuldades enfrentadas pelo esmerado aluno, o diretor do Pio XI concede um trabalho para que o pobre rapaz consiga satisfazer as suas mínimas necessidades.
    Sobre todas as adversidades foi superior o empenho e a força de vontade do moço pobre que a muito custo consegue ingressar no mundo acadêmico. Indubitavelmente o brasileiro Felipe Tiago Gomes faz parte de uma memorável epopeia, na qual protagoniza como herói ao enfraquecer um terrível paradigma que colocava as pessoas de poucos recursos à mercê dos enlaços da ignorância. Já que a educação era um privilégio e não um direito. Assim, as pessoas carentes mal concluíam o primário, o ensino ginasial, então, era uma aspiração distante.
   
5.    RECIFE E O APARECIMENTO DA MISSÃO


    Conservando o bom ânimo como faziam os apóstolos de Cristo, Felipe conclui o curso de Humanidades e ingressa na faculdade de Direito do Recife. No ambiente acadêmico é certo que o jovem sente o deleite da prévia realização, contudo é conhecedor de que as aflições do estudante pobre estarão constantemente a espreitá-lo. De tal modo que sua vida na Faculdade se desenrola como uma reiteração dos anos passados. Assim, precisa novamente da solidariedade dos homens e de trabalhar no ambiente onde estuda.  Primeiramente exerce o ofício de porteiro na casa do estudante, porém diante da admirável aplicação nas tarefas que desempenhava foi destinado à atividade de bibliotecário. Dessa forma, algo extraordinário ocorreria em sua vida que viria a transformar a incipiente realidade da educação brasileira.
     Desejoso de conhecimento, Felipe Tiago na qualidade de bibliotecário se debruçava sobre as inúmeras obras que ali havia. Foi assim que conheceu o livro DRAMA DA AMÉRICA LATINA, de John Gunther, que lhe mostrou uma fascinante experiência realizada pelo líder Peruano Haya de La Torre. Ele criara escolas para alfabetizar índios cujos professores eram estudantes que lecionavam gratuitamente, segundo Gomes, (1980, pág.13). Essa leitura propiciou o desenrolar de uma nobre missão de cidadania que, a partir deste momento, seria o centro de sua luta para levar a luz do conhecimento para aqueles carentes de recursos e saber.
    Felipe Tiago Gomes sabia do valor da educação para o desenvolvimento humano. Neste sentido é inspirado a levar o ensino ginasial gratuito para seus irmãos igualmente sedentos pelo conhecimento, entretanto impossibilitados por uma triste realidade social que os excluía de prosseguir estudando. As pesadas mensalidades para estudar afastavam muitos moços abastados de inteligência, mas desprovidos de riquezas. Dessa forma, crédulo da importância de sua iniciativa, Felipe convida alguns de seus companheiros que assim como ele conheciam de perto as dificuldades dos menos favorecidos para conseguir instrução de grau médio, já que eles próprios participaram desse sofrimento.
     A ideia do jovem idealista foi aceita com aclamação pelos seus colegas, portanto era o momento de começar a nobre missão. Logo aconteceram as primeiras reuniões, a ação se chamaria Campanha do Ginasiano Pobre. Estava difundido o gene de uma grandiosa obra que eternizaria a figura do seu criador, pois não fora edificada para a glória e o benefício de um grupo reduzido e aspirante por fama, mas sim para servir a uma autêntica missão de cidadania, cujo ideal era levar a luz do conhecimento para os que desejavam ampliar seus horizontes intelectuais, mas que para tanto só contavam com a força de vontade, algo que foi abundante em Felipe Tiago Gomes.
    Diante disso, junto com alguns colegas Felipe Tiago Gomes cria a CGP (Campanha do Ginasiano Pobre). São os primeiros passos de uma revolução na busca pela promoção da justiça social através da luz do conhecimento que dignifica os seres humanos.


6.    CONCRETIZANDO UM SONHO HUMANITÁRIO


A CGP nasceu do íntimo de jovens que se indignavam com a inércia dos setores públicos em oferecer instrução para os mais pobres. Diante dessa triste realidade eles próprios se empenharam em oferecer o ensino ginasial. Esses moços portavam do mais autêntico ideário cidadão ao protagonizarem uma ação essencialmente humana sem finalidade lucrativa ou partidária. A única ambição que movia aqueles corações juvenis era o desejo de oferecer maiores oportunidades para que mais brasileiros pudessem vislumbrar no amanhã dias melhores. De acordo como escreveu Felipe Tiago. 

Os fundadores da campanha não tiveram dinheiro fácil para estudar (...) e lhes revoltava ver tantos jovens desejosos de outros horizontes culturais e proibidos de alcançá-los por falta de recursos (...). Os filhos dos ricos podiam liberta-se da ignorância, os pobres estavam condenados a permanecer na infraestrutura social (GOMES, 1980, p.12).

Mantendo clara a vontade de fazer prosperar a luta, os jovens se empenharam em atrair adeptos. Em seguida buscaram a divulgação da campanha, quesito indispensável para fazer dela algo conhecido e respeitado. A imprensa desempenhou importante papel desde os primórdios desta empreitada, já que auxiliou para que a obra tomasse um cárater universal. Com o auxílio da boa impressa primorosas mentes se juntaram ao movimento oferecendo-se como mão-de-obra para somar esforços por uma realidade social promissora. Assim escreveu Felipe Tiago Gomes:

O boletim trouxe-nos valiosas adesões. A primeira foi nos seguintes termos:
   Felipe:
Li o Boletim da CGP. Tocou-me tão grande iniciativa. Sou um estudante pobre. Tenho obrigação de ajuda-lo nesta brilhante campanha, que é uma realização única de humanismo sadio. Darei meu esforço, meus braços, minha voz, minha pobre pena. Darei tudo.  E contem comigo.
 Abraços sou J. Cabral. Recife, 13-9-1943 (GOMES, 1980,  p.15)

    Era com essas pessoas simples e convictas de um bem maior que a CGP engatinhava em seu trabalho para instruir cidadãos com poucas perspectivas. Os desafios eram hercúleos, todavia a criatividade daqueles mocinhos idealistas era superioràs dificuldades que apenas serviam para engrandecer a honra daqueles que já estavam habituados a driblar as desventuras.
    Assim, entra em cena o Teatro do Estudante, grupo compostos por alunos que pretendiam angariar recursos para a CGP. Nessa ideia participaram personalidades hoje ilustres para a cultura brasileira a exemplo de Ariano Suassuna. Os garotos percorriam bairros e cidades nordestinas levando-lhes arte e a mensagem de seus ideais. Do mesmo modo para fazer prosperar a CGP realizavam anualmente semanas culturais para as quais convidavam palestrantes buscando disseminar idealismo e conseguir mais adeptos. Com tudo isso a campanha ganhava as páginas dos jornais, exemplo claro de seu progresso.
    Contudo, não se pode ignorar os apertos dos primeiros anos. Em uma sala de um prédio emprestado funcionava as aulas do curso ginasial gratuito, agora conhecido como GINÁSIO CASTRO ALVES, apesar da nomenclatura imponente os alunos assistiam aulas em pé, pois não havia carteiras. Entretanto, o ânimo dos pobres alunos sedentos da plena liberdade não esmorecia, o que rendeu o sucesso dessa empreitada denominada de CGP. Para vencer essas dificuldades, a campanha contava com a solidariedade dos homens, assim colocavam-se anúncios nos jornais pedindo doações. Por meio disso, em 1944 foram conseguidas 50 carteiras e inaugurou-se a biblioteca Miguel Couto. Dessa forma, Felipe Tiago Gomes buscava na sociedade o apoio de que necessitava para promover a sua obra de cidadania, a participação comunitária era o grande diferencial dessa ação, uma vez que era enfatizada a sua desvinculação com outros interesses que não fosse a causa da extensão do ensino ginasial gratuito. Ademais, o forte vínculo com a sociedade tornava a campanha essencialmente democrática, fator essencial para o sucesso de uma obra daquela dimensão.

7.    BATALHA COM A BUROCRACIA E A ODISSEIA NO RIO DE JANEIRO


    Em 1945 é aceso o desejo pelo funcionamento oficial do Ginásio Castro Alves. Os condutores dessa empreitada ignoravam os grandes empecilhos para a instalação de um ginásio, os rodeios da enfadonha burocracia era uma incógnita para aqueles moços idealistas acostumados com a superação das dificuldades. E assim partem para o Rio de Janeiro, embrenhando-se em uma verdadeira odisseia moderna em busca do reconhecimento do Ginásio Castro Alves. As dificuldades já começam logo na partida quando os jovens precisam viajar de carona em um avião da FAB. Estando no Rio de Janeiro precisam de ajuda para a hospedagem e por vários momentos necessitam barganhar com o gerente do hotel por estadia enquanto não encontram maior apoio e assim sucedem improvisações para driblar os desafios na “cidade grande”.
    Apesar dos grandes esforços e das horas de espera no salão do ministério o reconhecimento do Ginásio Castro Alves não foi cedido, entretanto os alunos realizaram os exames de admissão, mesmo sem o consentimento do MEC. Nas mentes daqueles garotos não havia espaço para desânimo, os desafios eram o combustível que os movia.
    No ano seguinte, em 1946 uma grandiosa conquista se concretiza para aqueles garotos que desde 1943 lutavam incessantemente, o Ginásio Castro Alves fora reconhecido pelo MEC. A escola da comunidade passou a ser um movimento reconhecido e legítimo. Nesse mesmo ano passa a registrar o nome Campanha dos Ginásios Populares, já que esse período coincidia com a expansão do comunismo, portanto para não assumir um caráter sentimentalista e partidário muda-se o nome, mudaram-se as nomenclaturas por algumas vezes até consolidar-se como CAMPANHA NACIONAL DAS ESCOLAS DA COMUNIDADE (CNEC), entretanto a essência continuou a mesma.
    O reconhecimento oficial da campanha foi um divisor de águas que promoveria uma elevação inimaginável para o movimento. Era impossível não se admirar e comover com tamanho espírito de civismo que florescia dos corações daqueles garotos que se dividia entre seus trabalhos e a preocupação em instruir aquelas pessoas tão simples quanto eles. A campanha dos ginásios tomaria o país levando consigo um ideal de esperança e solidariedade. O Brasil nunca vira tão verdadeiro espírito de cidadania como o que refluía daqueles jovens deixando indício de um amanhã mais promissor.

8.    “CNEC A OBRA QUE ASSUSTA OS QUE NÃO A CONHECEM”


    Neste período de 1946 o País apresentava uma conjuntura política mais sóbria do que em momentos anteriores da história. Tínhamos um presidente eleito pelo povo, a democracia parecia que pairava na pátria e os soldados voltaram vencedores da guerra. Todavia no meio social, especialmente no setor educacional permanecia inalterado um continuísmo de improvisações e desprezo. Diante desta triste realidade Felipe Tiago Gomes se propõe a expandir a campanha pela nação ajudando a promover aquilo que o estado não priorizava.
    A CNEC expande-se e tornar-se real a escola comunitária, algo inédito no Brasil. O sucesso da campanha pelos estados brasileiros era uma clara demonstração da carência que o setor educacional sofria. Metaforicamente é como escreveu o profeta Isaias: “Aqueles que estavam nas trevas viram uma grande luz”. Era a luz do conhecimento que Felipe Tiago Gomes espalhava como se fosse instrumento divino, procedia como verdadeiro apóstolo da educação comunitária ao levar esperanças enfatizando que mesmo os mais pobres também poderiam sonhar com um futuro próspero, pois conquistariam por meio da instrução gratuita. Como consequência da magnífica atuação, a CNEC conquista importantes apoios. Políticos se interessam e surgem projetos de lei que beneficiam a entidade assim como emendas que garantem a colaboração financeira por parte do Governo Federal, de acordo com a lei n° 1.717, de 1989.
    A CNEC se tornou maior do que imaginavam aqueles jovens sonhadores que em 1943 diante da efervescência de uma guerra mundial estavam convictos que precisariam vencer um terrível inimigo, a ignorância que se estendia de um extremo a outro do país, uma vez que as taxa de analfabetismo naquela época eram gritantes. Sendo que dos 40 milhões de brasileiros pouco menos de 30% da população entre sete e catorze anos frequentavam a escola, segundo (CNEC em revista/ Julho/ Agosto/Set 1982. Pagina 23).
    Um novo ideal de escola nasce no Brasil, a qual tem a comunidade como principal parceira e responsável pela sua manutenção. A mais nobre e singular característica da Campanha é justamente a sua preocupação com as aspirações do meio onde atua. São as pessoas que determinam os rumos a seguir, se responsabilizando inclusive pelas despesas. Nesse contexto, a Campanha das escolas da comunidade se configurou no cenário nacional como uma iniciativa precursora com duplo pioneirismo ao optar pelos mais pobres e pela interiorização, de acordo com (CNEC em revista/ Julho/ Agosto/Set 1982. Página 23).
    Foi nesse ambiente de promoção do bem comum e exaltação da cidadania que o movimento, tornou-se gigantesco e promovedor de uma revolução pela democratização do ensino e de direitos básicos. Durante mais de seis décadas, milhares de estudantes tiveram uma oportunidade de seguir em frente em seus estudos mesmo que para isso só possuíssem o bom ânimo. Indubitavelmente, é impossível calcular a grandiosidade do bem que a campanha e seu idealizador promoveram. Quantos brasileiros e brasileiras sentiram-se acolhidos e capazes de serem “gente na vida”? Gente, pois mesmo nosso país não destinando mecanismo para melhorar a vida dos mais pobres, era e ainda é comum considerar ás margens aqueles que devido a conjuntura social injusta, vivem relegados a pobreza e a ignorância. Essa realidade o professor Felipe conseguiu amenizar na vida de muitos indivíduos e mesmo do lar celestial sua influência de promoção do bem comum continua a se propagar.

9.    A CNEC EM PICUÍ
   

    O sucesso da campanha pelo Brasil e a deficiência do setor educacional picuiense fez com que a CNEC se implantasse também nesta cidade. Picuí foi modelo do movimento cenecista sintetizando os objetivos da campanha ao possuir creche, pré-escola, ensino formal para o 1° e 2° graus, um estádio e ginásio coberto para práticas de esportes onde se realizava eventos culturais, curso de técnicas agropecuárias, serigrafia, artesanato, doces caseiros, carpintaria e marcenaria, lapidação e montagem de joias, bombeiro hidráulico e eletricista, microempresa de confecção e gráfica. Além de uma emissora de rádio, um hospital e serviços de hotelaria. Hoje em dia ao analisar a importância da CENEC para a sociedade atual, os filhos de Picuí lembram com admiração a polidez do ilustre conterrâneo, que não poupava esforços para ver o desenvolvimento de sua terra, mesmo atualmente ainda é possível perceber que muito dos seus feitos ainda permanecem como triunfo de uma grande missão, a exemplo da rádio Cenecista.
    Ao implantar a entidade em sua cidade natal, o professor Felipe queria levar muito mais do que o ensino secundário e profissionalizante sentia necessidade de disseminar também cultura e entretenimento, dessa forma a emissora diferenciou Picuí de outras localidades que receberam os serviços da CNEC ao complementaras atividades relacionadas ao ensino, cultura e saúde, além da prestação de serviços a órgãos públicos, empresas privadas, entidades particulares e à comunidade em geral. (CNEC em Revista, 1982). A rádio Cenecista atualmente presta fundamental apoio para sociedade picuiense ao disponibilizar informações e outras utilidades públicas que torna a sociedade mais independe e detentora das próprias opiniões.

   

10.    O BEM QUE SE PERPETUA


                Em 1996 o apóstolo da educação comunitária encerra sua memorável história de luta, foi chegada a hora que o criador quis ao se lado o seu discípulo amado que tão bem exerceu sua incumbência de amar ao próximo. É possível que até os anjos se encantaram quando abriram o livro da vida e leram sobre aquela existência pautada para o bem.
    A morte de Felipe Tiago Gomes foi um duro golpe para a CNEC. Entretanto, a realização do bem é uma ação marcada pela trancedentalidade. Ademais, toda a vida do professor Felipe, como é carinhosamente chamado, foi resumida a sua missão de cidadania e civismo, priorizando a melhoria de vida de inúmeros brasileiros que assim como ele sonhavam com dias melhores. Portanto, construiu uma obra transcendental que mesmo hoje em dia encanta e emociona. Muitos picuienses passaram pela CNEC, atualmente alguns são educadores outros políticos, advogados, entre tanto outros profissionais que embora exerçam funções diferentes compartilham algo comum, a gratidão ao empenho de um homem que através de seu idealismo e solidariedade transformou suas vidas no momento em que lhes ofereceu uma oportunidade.  Essas pessoas através de sua vida e profissionalismo transmitem o espírito de seu mestre tornando-o sempre vivo e atuante na medida em que deixam fluir a essência humanitária que caracterizou Felipe Tiago Gomes.

11.    A CNEC NO CONTEXTO ATUAL


    A atuação da CNEC no contexto contemporâneo apresenta-se mais modesta do que em décadas anteriores, isso por que a entidade sempre atuou em consonância com as necessidades da comunidade desassistida pelo poder público que ignorava os apelos sociais por melhorias. Felizmente no contexto atual se vive um período mais flexível, no qual se fala mais sobre a erradicação da miséria e da promoção de ensino médio e superior para todos. É certo que ainda persistem muitos vícios e desmantelos, especialmente no setor educacional. Contudo, não se pode negar que o estado está mais presente.
     No entanto, isso não significa que a CNEC foi abatida pelo contrário, hoje a entidade deve-se considerar a mais vitoriosa de todo o processo, pois sem dúvida muito contribuiu para sensibilizar a sociedade sobre a importância do espírito transformador da educação. Afinal a bandeira de luta do movimento iniciou-se primordialmente para chamar a atenção dos governantes sobre a necessidade de prestar assistência a população carente necessitada de ampliar seus horizontes intelectuais. Nesse sentido, se hoje a CNEC tem menos trabalho é porque muito já avançou em sua missão humanitária de expandir o conhecimento.

12.    O APÓSTOLO E SEU LEGADO


            Felipe Tiago Gomes foi um ser humano diferente. Muito adiante de sua própria época era um idealista imbuído do mais autêntico espírito cidadão. Seu ânimo diante das adversidades nos revela um homem que tinha um ideal maior do que as próprias limitações. Sua vida inteira foi entregue a uma causa célebre que se traduziu na promoção do bem comum. É fascinante estudar sua vida e perceber na própria existência a sua influência mesmo nunca tendo conhecido. A razão desse enigma é o caráter transcendente de sua ação que deixou um legado digno de sua grandeza.
           A herança deixada pela sua obra é superior aos feitos materiais da CNEC, pois passa pela transmissão de uma ideologia que coloca a educação no seu verdadeiro lugar, o de transformar pessoas. Esse ideal é um grande exemplo para aqueles que fazem a educação desse país. É sabido que muitos avanços já foram realizados, contudo o setor educacional ainda não se constitui como prioridade continua convivendo com as incertezas das políticas públicas e com a precariedade de muitos profissionais que não consideram a causa da educação, pois não foram convertidos pela sua essência transformadora.
    O legado de Felipe Tiago Gomes é incontestável e qualquer um de seus conterrâneos pode atestar, entretanto se faz necessário incentivar mais fervorosamente a memória de um ícone da educação nacional. Se não conservarmos nossa história, certamente nos perderemos no futuro. É imprescindível que o apóstolo da educação comunitária seja admirado em sua própria pátria, é o mínimo que se pode fazer em honra a uma memória de exaltação a cidadania, ao civismo e, por fim, ao bem.

13.     CONCLUSÃO


    “A obra do bem comum passa pela fraternidade e dura mais do que quem a faz”. Sábios foram esses vocábulos pronunciados pelo professor Felipe, que traduzem o cerne de toda a sua ação que indubitavelmente é eterna e transcendental. A vida e a obra do apóstolo da educação comunitária é uma verdadeira epopeia que leva a reflexão de qual é o limite do amor ao próximo, já que toda a história a qual os livros tentam descrever revelam um homem que desde a mais tenra idade demonstrava que estava no mundo para realizar algo diferente como multiplicar os talentos dado pelo criador, não os desperdiçou como tanto outros indivíduos que não conseguem usufruir de seus potenciais. Felipe Tiago Gomes foi o apóstolo que soube multiplicar os talentos do mestre e fez muito mais distribuiu o excedente para aqueles que assim como ele desejavam igualmente ser diferentes e disseminadores do bem.
    A luz que permanecia no professor Felipe não ficou escondida, mas foi hasteada para que iluminasse a todos, esse foi o seu desejo quando estando na casa do estudante é tomado pelo sentimento de indignação ao concluir que pela  estrutura social vigente aos pobres restavam a alienação e por conseguinte a exclusão. Conhecedor das dificuldades das classes humildes, pois dela fazia parte sente a necessidade de erradicar essa injustiça. Para isso distribui o seu único e mais valioso bem: o conhecimento que construíra dia após dia, diante de inúmeras privações, assim é inspirado a idealizar uma obra gigantesca que hoje é conhecida como CNEC, responsável direta por transformar a vida de milhares de brasileiros que tiveram uma chance na vida de sentir-se capaz de se realizar plenamente. Mesmo hoje em dia, a memória de Felipe Tiago Gomes é transmitida como exemplo de uma existência verdadeiramente humana e cidadã e seu idealismo continua a se propagar, já que dificilmente o tempo apagará uma personalidade que realizou um bem incalculável e sem limite de alcance.


REFERÊNCIAS


CNEC em Revista. julho/agosto/set. 1982. 
____________. Edição Extra: Vida e obra do Fundador: Setembro 1997.

FERREIRA, ROBSON  Rubenilson  dos  Santos. Título. Monografia de pós- graduação Lato Sensu pela UEPB (Universidade Estadual da Paraíba), apresentada em 2005, p. 1-53.

GOMES, FELIPE TIAGO. História da Campanha Nacional de Escolas da Comunidade. Brasília. CNEC Edições. 5ª Ed. 1980.


HENRIQUES, Maria de Lourdes. CNEC / Picuí-Pb 25 anos – Documentário 1986. sem editora, 1986.
__________. História de Vida – 45 anos Educando. João Pessoa: Idéia. 2003


HOLANDA, Ivanildo Coelho de. CNEC – Um estudo histórico. João Pessoa, Editora Universitária / UFPB. 1981. Edição Comemorativa 60 anos: CNEC, novembro de 2003.